Sem fugir à tradição, após o hastear da Bandeira e os habituais cumprimentos pelos Bombeiros Voluntários do Concelho de Espinho, a sessão comemorativa do 25 de Abril acolheu uma sala cheia, no salão nobre dos Paços do Município.
Os representantes dos partidos políticos com assento naquele órgão autárquico, tiveram a oportunidade de recordar a Revolução dos Cravos e de relembrar os valores que daí vieram, há 51 anos, para a democracia e para a vida dos portugueses e dos espinhenses em particular.
“Uma data que não pertence apenas à história — pertence à nossa identidade coletiva”, como referiu a presidente da AM, Joana Devezas, reforçando que “Abril não é apenas memória, é presente e, sobretudo, é futuro. Um futuro que se constrói todos os dias com responsabilidade cívica, justiça social e proximidade às pessoas”.
Joana Devezas referiu-se concretamente a este mandato autárquico que, segundo sua opinião, “tem sido particularmente exigente” e que “as circunstâncias que envolveram o seu início, colocaram-nos perante um verdadeiro teste à resiliência das instituições e à maturidade democrática do nosso concelho”.
A presidente da AM relembrou o “contexto de enorme instabilidade” e a missão que teve de “garantir imparcialidade, respeito institucional e a defesa intransigente dos valores democráticos”, reconhecendo o papel dos seus colegas membros da AM que, apesar dos “constrangimentos inimagináveis” com que se depararam, “prevaleceu, o compromisso com o bem comum”.
“Quando se debatem prioridades com base na justiça, quando se garantem decisões fundadas no interesse público e na transparência, estamos a honrar o mandato que nos foi confiado”, acrescentou.
Joana Devezas destacou o poder local como “uma das mais notáveis conquistas da Revolução” e lembrou que o voto é um “pilar da nossa vida democrática”, num ano em que se irão realizar dois atos eleitorais – as Legislativas e as Autárquicas.
“As nossas comunidades serão tanto mais fortes quanto mais legítimos forem os seus representantes. Para isso, é essencial que promovamos um debate público esclarecido, rigoroso e elevado”, sublinhou, acrescentando que “temos a responsabilidade de garantir uma campanha centrada nas verdadeiras necessidades do território, livre de guerrilhas pessoais ou partidárias”.
“Espinho quer continuar a ser exemplo de cidadania ativa, de responsabilidade democrática e de visão partilhada”, concluiu a presidente da AM.
“Três anos e meio de estagnação”
Nos discursos dos partidos da oposição destacam-se as críticas à governação socialista. O vogal Nuno Almendra, representante do Partido Social Democrata (PSD), apontou o trabalho dos políticos que “são também eles o povo”.
“A política é uma arte de solucionar os problemas das pessoas, promovendo a igualdade de oportunidades”, disse Nuno Almendra, acrescentando que “não pode ser encarada como instrumento de posse do poder” e que “não serve para alimentar egos”.
“A política da fotografia, da promessa irrealista, das festinhas não serve o interesse do povo. É preciso elevar o debate político, rejeitando soluções simplistas para desafios complexos. É preciso responsabilizar os titulares dos cargos públicos, combatendo o populismo, a demagogia e a desinformação. É preciso envolver a sociedade civil. É preciso que os jovens conheçam o passado para poderem decidir o futuro com consciência e liberdade”, afirmou o vogal social-democrata.
Nuno Almendra lembrou os “tempos desafiantes” e de “incerteza” a que a “velocidade dos acontecimentos exige responsabilidade, conhecimento, dedicação, concretização”.
Para o vogal da AM, o desenvolvimento do território espinhense “não nos permite parar”. “Somos convocados permanentemente para novos desafios e novas metas que são necessárias serem alcançadas”. Neste sentido, “é hora de preparar e acautelar o futuro do nosso concelho, permitindo que os próximos anos sejam de progresso e modernidade”, alertou.
O vogal do PSD criticou os últimos três anos e meio de governação socialista que, sem sua opinião “foram de estagnação”. “Acredito que Abril nos dê a força e a inspiração para nos focarmos com muita determinação nesta nova realidade com confiança e esperança”, acrescentou.
“Não podemos sobrepor o populismo e a demagogia àquilo que é importante para um território, àquilo que promove a igualdade das suas gentes. Os desafios são muitos, nomeadamente, habitação, rede viária, escolas, saúde, emprego, lazer, equipamentos desportivos e culturais e ambiente. Não podemos desperdiçar oportunidades por manifesta incapacidade. Não podemos ignorar as necessidades das nossas gentes”, apontou o vogal que terminou a sua intervenção deixando “uma mensagem de esperança”.
“Espinho não pode continuar a viver da ilusão”
Na sua intervenção, o presidente da Junta da União das Freguesias de Anta e Guetim, Nuno Almeida, que representou o Partido Socialista (PS), lembrou que “a democracia também se constrói com memória e gratidão” e, por isso, deixou “uma palavra de homenagem aos autarcas que contribuíram nesse caminho, em especial, aos autarcas socialistas” como “Artur Bártolo, Rolando de Sousa, José Mota, Napoleão Guerra, Abel Gonçalves, entre tantos outros” e que, em seu entender, tiveram “visão, coragem e dedicação, deram corpo a valores de Abril neste território, com falhas, mas com obra feita”.
Nuno Almeida reconheceu que o papel de todas as forças políticas “foram essenciais”, porque “a democracia é plural”.
“É dessa pluralidade feita de consenso e divergências, de disputas e convergências, que se constrói um concelho mais justo, mais coeso e mais livre”, justificou.
O socialista lembrou o papel dos autarcas das freguesias que “estão na linha da frente da resposta pública” e onde “a política se faz com ética e com afeto”.
“O meu reconhecimento a todos os autarcas de freguesia. Aqui nas pessoas dos meus colegas presentes juntas, pelo trabalho silencioso, diário, tantas vezes invisível, mas sempre essencial”, destacou, acrescentando que “é nesse quotidiano de proximidade, que a democracia se renova e se ganha”.
Para Nuno Almeida, “nenhuma liberdade está completa se não for vivida também nos lugares onde pertencemos”. “Espinho é fruto do mar, do caminho de ferro, da coragem de quem aliou o esforço ao sonho e do engenho a quem soube dar forma à cidade com linhas retas e horizontais. Mas essa mesma cidade, que no passado soube ser exemplo de planeamento e coesão, precisa agora de reencontrar o seu rumo”, explicou.
“Espinho não pode continuar a viver da ilusão de ser uma cidade encantada ou uma praça das maravilhas permanente. Bela à superfície, mas cada vez mais desigual e frágil na sua base. O futuro exige mais do que imagem”, criticou, acrescentando que “exige projeto, compromisso e proximidade”, rumo que “só se encontra quando percebemos que o concelho é muito mais do que seu centro e que todas as freguesias são parte da resposta e não apenas parte da fotografia”.
“Durante anos o pensamento centralista ignorou realidades que vivem fora do postal turístico”, afirmou o presidente de Junta socialista, explicando que “Espinho precisa de abrir as suas margens e dar lugar aos que aqui querem viver, crescer e envelhecer com dignidade”.
Nuno Almeida apontou as críticas à Linha de Alta Velocidade que “se mal pensadas, podem dividir mais do que unir, cortar mais do que ligar”. “Precisamos de garantir que servem o território e as pessoas e que o desenvolvimento não passa por cima de ninguém”.
Por fim, o autarca do PS disse que “Espinho precisa de olhar para o mar não como decoração, mas como horizonte”. “O mar que sempre nos definiu como destino, como economia, de subsistência, como identidade. É o mar que nos liga ao mundo, que nos oferece oportunidades da economia azul, do turismo responsável, na educação ambiental, no estudo científico, na inovação ligada ao território. Seria um erro histórico virar-lhe as costas, uma oportunidade perdida não integrar numa estratégia sustentável e ambiciosa para um futuro de Espinho”.
“Temos talento, temos mar, temos localização, temos cultura, temos desporto, mas, sobretudo, temos gente. Gente trabalhadora, resiliente, com orgulho no que constrói, com vontade de continuar a pertencer, gente que não desiste à primeira dificuldade, que sabe o valor do esforço coletivo e que nunca perdeu o sentido de comunidade”, concluiu.
Críticas às políticas desde a habitação à saúde
O vogal do Bloco de Esquerda (BE), Bruno Morais, recordou os valores conquistados em abril de 1974 e naqueles que ainda se mantêm por cumprir, nomeadamente “o trabalho precário, contratos temporários sucessivos, horários desregulados e um salário mínimo que não permite viver com dignidade” e a habitação que está a “tornar-se um luxo para a classe média e as rendas das habitações que absorverem mais de metade do salário de quem trabalha”.
O vogal do BE criticou a saúde público que está a ser tratada “como um negócio, acessível apenas aos que podem pagar” e a escola pública que “está a definhar” com a “falta de professores, educadores e assistentes operacionais, escolas degradadas e alunos sem apoios educativos adequados”.
“Em Espinho, sabemos que a habitação se tornou um direito, cada vez mais, inacessível. Jovens e famílias são empurrados para a periferia, porque os salários não acompanham os preços das casas”, denunciou o bloquista, acrescentando que “precisamos de um verdadeiro programa de habitação pública, com controlo de rendas, preços justos e acessíveis, porque ter uma habitação não deve ser um luxo, é um direito”.
Bruno Morais também apontou as críticas para a crise ambiental. “A erosão costeira, a poluição das ribeiras e das praias, a rede de distribuição de água, que tem perdas gigantescas, e o transporte público que é desadequado às necessidades das pessoas, são problemas que exigem ação imediata”, afirmou.
Para o vogar do BE a Linha do Vouga “continua à espera da requalificação prometida há décadas” e “é um exemplo cruel do centralismo e da negligência para com as pessoas”.
A cultura e o desporto também estiveram no discurso do bloquista como sendo “um dos pilares da identidade coletiva espinhense”, que “têm uma riqueza cultural única”, mas que “anos a fio de negligência na manutenção dos edifícios deixaram os espaços culturais e desportivos, bem como outros edifícios públicos, degradados”, terminou.
“Sempre estivemos ao lado dos que trabalham”
A representante da Coligação Democrática Unitária (CDU), Pilar Gomes lembou a existência do Partido Comunista Português, “com mais de 100 anos”, a “lutar contra a opressão, a censura, a pobreza, escravidão do povo que trabalha sem receber para viver com dignidade”.
Pilar Gomes apontou os problemas com o Serviço Nacional de Saúde e criticou o facto de alguns residentes em Espinho terem de se deslocar para o Polo de Paramos para a Unidade de Saúde Familiar Mar à Vista, assim como a “falta de investimento nas escolas públicas”.
“Sempre estivemos ao lado dos que trabalham, dos mais desfavorecidos e dos qque precisam, fazendo uma muralha de aço contra todos os que querem destruir o Portugal democrático, social e da paz”, referiu a vogal comunista.
“O trabalho, a honestidade e a competência, lema histórico da CDU, nunca foram tão necessários após o embaraço pelo que o PSD e PS fizeram passar os espinhenses”, disse a vogal, mostrando-se “disponíveis para todas as responsabilidades que os portugueses e os espinhenses nos quiseram dar”.